Vinícius de Moraes_Poemas


 

 
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Virgem! filha minha
De onde vens assim
Tão suja de terra
Cheirando a jasmim
A saia com mancha
De flor carmesim
E os brincos da orelha
Fazendo tlintlin?
Minha mãe querida
Venho do jardim
Onde a olhar o céu
Fui, adormeci.
Quando despertei
Cheirava a jasmim
Que um anjo esfolhava
Por cima de mim...
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Amiga, infinitamente amiga
Em algum lugar teu coração bate por mim
Em algum lugar teus olhos se fecham à idéia dos meus.
Em algum lugar tuas mãos se crispam, teus seios
Se enchem de leite, tu desfaleces e caminhas
Como que cega ao meu encontro...
Amiga, última doçura
A tranquilidade suavizou a minha pele
E os meus cabelos. Só meu ventre
Te espera, cheio de raízes e de sombras.
Vem, amiga
Minha nudez é absoluta
Meus olhos são espelhos para o teu desejo
E meu peito é tábua de suplícios
Vem. Meus músculos estão doces para os teus dentes
E áspera é minha barba. Vem mergulhar em mim
Como no mar, vem nadar em mim como no mar
Vem te afogar em mim, amiga minha
Em mim como no mar...
 
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A cidade mudou. Partiu para o futuro
Entre semoventes abstratos
Transpondo na manhã o imarcescível muro
Da manhã na asa dos DC-4s
 
Comeu colinas, comeu templos, comeu mar
Fez-se empreiteira de pombais
De onde se vêem partir e para onde se vêem voltar
Pombas paraestatais.
 
Alargou os quadris na gravidez urbana
Teve desejos de cúmulos
Viu se povoarem seus latifúndios em Copacabana
De casa, e logo além, de túmulos.
 
E sorriu, apesar da arquitetura teuta
Do bélico Ministério
Como quem diz: Eu só sou a hermeneuta
Dos códices do mistério...
 
E com uma indignação quem sabe prematura
Fez erigir do chão
Os ritmos da superestrutura
De Lúcio, Niemeyer e Leão.
 
E estendeu ao sol as longas panturrilhas
De entontecente cor
Vendo o vento eriçar a epiderme das ilhas
Filhas do Governador.
 
Não cresceu? Cresceu muito! Em grandeza e miséria
Em graça e disenteria
Deu franquia especial à doença venérea
E à alta quinquilharia.
 
Tornou-se grande, sórdida, ó cidade
Do meu amor maior!
Deixa-me amar-te assim, na claridade
Vibrante de calor!
 
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Quem pagará o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?
Quem, dentre amigos, tão amigo
Para estar no caixão comigo?
Quem, em meio ao funeral
Dirá de mim: - Nunca fez mal...
Quem, bêbedo, chorará em voz alta
De não me ter trazido nada?
Quem virá despetalar pétalas
No meu túmulo de poeta?
Quem jogará timidamente
Na terra um grão de semente?
Quem elevará o olhar covarde
Até a estrela da tarde?
Quem me dirá palavras mágicas
Capazes de empalidecer o mármore?
Quem, oculta em véus escuros
Se crucificará nos muros?
Quem, macerada de desgosto
Sorrirá: - Rei morto, rei posto...
Quantas, debruçadas sobre o báratro
Sentirão as dores do parto?
Qual a que, branca de receio
Tocará o botão do seio?
Quem, louca, se jogará de bruços
A soluçar tantos soluços
Que há de despertar receios?
Quantos, os maxilares contraídos
O sangue a pulsar nas cicatrizes
Dirão: - Foi um doido amigo...
Quem, criança, olhando a terra
Ao ver movimentar-se um verme
Observará um ar de critério?
Quem, em circunstância oficial
Há de propor meu pedestal?
Quais os que, vindos da montanha
Terão circunspecção tamanha
Que eu hei de rir branco de cal?
Qual a que, o rosto sulcado de vento
Lançará um punhado de sal
Na minha cova de cimento?
Quem cantará canções de amigo
No dia do meu funeral?
Qual a que não estará presente
Por motivo circunstancial?
Quem cravará no seio duro
Uma lâmina enferrujada?
Quem, em seu verbo inconsútil
Há de orar: - Deus o tenha em sua guarda.
Qual o amigo que a sós consigo
Pensará: - Não há de ser nada...
Quem será a estranha figura
A um tronco de árvore encostada
Com um olhar frio e um ar de dúvida?
Quem se abraçará comigo
Que terá de ser arrancada?
 
Quem vai pagar o enterro e as flores
Se eu me morrer de amores?
 
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Não é o grito
A medida do abismo?
Por isso eu grito
Sempre que cismo
Sobre tua vida
Tão louca e errada...
- Que grito inútil!
- Que imenso nada!
 
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A morte vem de longe
Do fundo dos céus
Vem para os meus olhos
Virá para os teus
Desce das estrelas
Das brancas estrelas
As loucas estrelas
Trânsfugas de Deus
Chega impressentida
Nunca inesperada
Ela que é na vida
A grande esperada!
A desesperada
Do amor fratricida
Dos homens, ai! dos homens
Que matam a morte
Por medo da vida.
 
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A morte em mim. Alguém (o medo) desce
Uma rua noturna, e de repente
Vê, soturna, no céu, a Lua, e sente
O horror da Lua, e súbito enlouquece.
 
A morte em cada ser. E alguém (a mágoa)
Que por insone chega-se à janela
Possui a mesma Lua dentro dela
Que em sua carne se transforma em água.
 
A Poesia em tudo.
E a doçura de não ser mais. Ficará
Sentado, na vertente, junto ao rio
Vendo umas nuvens brancas, vendo o rio.
 
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Eu sou feita de madeira
Madeira, matéria morta
Mas não há coisa no mundo
Mais viva do que uma porta.
 
Eu abro devagarinho
Pra passar o menininho
Eu abro bem com cuidado
Pra passar o namorado
Eu abro bem prazenteira
Pra passar a cozinheira
Eu abro de supetão
Pra passar o capitão.
 
Só não abro pra essa gente
Que diz (a mim bem me importa...)
Que se uma pessoa é burra
É burra como uma porta.
 
Eu sou muito inteligente!
Eu fecho a frente da casa
Fecho a frente do quartel
Fecho tudo nesse mundo
Só vivo aberta no céu!
 
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Brancas
Azuis
Amarelas
E pretas
Brincam
Na luz
As belas
Borboletas.
 
Borboletas brancas
São alegres e francas.
 
Borboletas azuis
Gostam muito de luz.
 
As amarelinhas
São tão bonitinhas!
 
E as pretas, então...
Oh, que escuridão!
 
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(O anjo e o túmulo)
I
Meu amigo Pedro Nava
Em que navio embarcou:
A bordo do Westphalia
Ou a bordo do Lidador?
 
Em que antárticas espumas
Navega o navegador
Em que brahmas, em que brumas
 
Pedro Nava se afogou?
 
Juro que estava comigo
Há coisa de não faz muito
Enchendo bem a caveira
Ao seu eterno defunto.
 
Ou não era Pedro Nava
Quem me falava aqui junto
Não era o Nava de fato
Nem era o Nava defunto?...
 
Se o tivesse aqui comigo
Tudo se solucionava
Diria ao garçom: Escanção!
Uma pedra a Pedro Nava!
 
Uma pedra a Pedro Nava
Nessa pedra uma inscrição:
"- deste que muito te amava
teu amigo, teu irmão..."
 
Mas oh, não! que ele não morra
Sem escutar meu segredo
Estou nas garras da Cachorra
Vou ficar louco de medo
 
Preciso muito falar-lhe
Antes que chegue amanhã:
Pedro Nava, meu amigo
DESCEU O LEVIATÃ!
 
II
A moça dizia à lua
Minha carne é cor-de-rosa
Não é verde como a tua
Eu sou jovem e formosa.
Minhas maminhas - a moça
À lua mostrava as suas –
Têm a brancura da louça
Não são negras como as tuas.
E ela falava: Meu ventre
É puro - e o deitava à lua
A lua que o sangra dentro
Quem haverá que a possua?
Meu sexo - a moça jogada
Entreabria-se nua –
É o sangue da madrugada
Na triste noite sem lua.
Minha pele é viva e quente
Lança o teu raio mais frio
Sobre o meu corpo inocente...
Sente o teu como é vazio.
III
 
A sombra decapitada
Caiu fria sobre o mar...
Quem foi a voz que chamou?
Quem foi a voz que chamou?
 
- Foi o cadáver do anjo
Que morto não se enterrou.
 
Nas vagas boiavam virgens
Desfiguradas de horror...
O homem pálido gritava:
Quem foi a voz que chamou?
 
- Foi o extático Adriático
Chorando o seu paramor.
De repente, no céu ermo
A lua se consumou...
O mar deu túmulo à lua.
Quem foi a voz que chamou?
 
- Foi a cabeça cortada
Na praia do Arpoador.
 
O mar rugia tão forte
Que o homem se debruçou
Numa vertigem de morte:
Quem foi a voz que chamou?
 
- Foi a eterna alma penada
Daquele que não amou.
 
No abismo escuro das fragas
Descia o disco brilhante
Sumindo por entre as águas...
Oh lua em busca do amante!
E o sopro da ventania
Vinha e desaparecia.
 
Negro cárcere da morte
Branco cárcere da dor
Luz e sombra da alvorada...
A voz amada chamou!
 
E um grande túmulo veio
Se desvendando no mar
Boiava ao sabor das ondas
Que o não queriam tragar.
 
Tinha uma laje e uma lápide
Com o nome de uma mulher
Mas de quem era esse nome
Nunca o pudesse dizer.
 
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Meu sonho (o mais caro)
Seria, sem tema
Fazer um poema
Como um dia claro.
 
E vê-lo, fantástico
No papel pautado
Ser parte e teclado
Poético e plástico.
 
Com rima ou sem rima
Livre ou metrificado
- Contanto que exprima
O impropositado.
 
 
E que (o impossível
Talvez desejado)
Não fosse passível
De ser declamado.
 
Mas que o sonho fique
Na paz sine-die
Ça c'est la musique
Avant la poésie.
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O céu está parado, não conta nenhum segredo
A estrada está parada, não leva a nenhum lugar
A areia do tempo escorre de entre meus dedos
        Ai que medo de amar!
 
O sol põe em relevo todas as coisas que não pensam
Entre elas e eu, que imenso abismo secular...
As pessoas passam, não ouvem os gritos do meu silêncio
        Ai que medo de amar!
 
Uma mulher me olha, em seu olhar há tanto enlevo
anta promessa de amor, tanto carinho para dar
u me ponho a soluçar por dentro, meu rosto está seco
Ai que medo de amar!
 
Dão-me uma rosa, aspiro fundo em seu recesso
E parto a cantar canções, sou um patético jogral
Mas viver me dói tanto! e eu hesito, estremeço...
        Ai que medo de amar!
 
E assim me encontro: entro em crepúsculo, entardeço
ou como a última sombra se estendendo sobre o mar
Ah, amor, meu tormento!... como por ti padeço
    Ai que medo de amar!
 
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De repente o sol raiou
E o galo cocoricou:
 
- Cristo nasceu!
 
O boi, no campo perdido
Soltou um longo mugido:
 
- Aonde? Aonde?
 
Com seu balido tremido
igeiro diz o cordeiro:
 
- Em Belém! Em Belém!
 
Eis senão quando, num zurro
Se ouve a risada do burro:
 
- Foi sim que eu estava lá!
 
E o papagaio que é gira
Pôs-se a falar: - É mentira!
 
Os bichos de pena, em bando
Reclamaram protestando.
 
O pombal todo arrulhava:
- Cruz credo! Cruz credo!
 
Brava
 
A arara a gritar começa:
 
- Mentira? Arara. Ora essa!
- Cristo nasceu! - canta o galo.
- Aonde? - pergunta o boi.
- Num estábulo! - o cavalo
ntente rincha onde foi.
 
Bale o cordeiro também:
 
- Em Belém! Mé! Em Belém
 
E os bichos todos pegaram
O papagaio caturra
E de raiva lhe aplicaram
Uma grandíssima surra.
 
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A grande ocorrência
Que nos conta o sino
É que, na indigência
Nasceu um menino.
 
Mil e novecentos
E cinqüenta e três
Anos são peremptos
Dessa meninez.
 
Muito tempo faz...
Mas ninguém olvida
Que é um dia de paz...
Porque fez-se a vida!
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Cheguei. Sinto de novo a natureza
Longe do pandemônio da cidade
Aqui tudo tem mais felicidade
Tudo é cheio de santa singeleza
 
Vagueio pela múrmura leveza
Que deslumbra de verde e claridade
as nada. Resta vívida a saudade
a cidade em bulício e febre acesa
Ante a perspectiva da partida
Sinto que me arranca algo da vida
Mas quero ir. E ponho-me a pensar
 
Que a vida é esta incerteza que em mim mora
A vontade tremenda de ir-me embora
E a tremenda vontade de ficar.
 
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Amo andar pelas tardes sem som, brandas, maravilhosas
Com riscos de andorinhas pelo céu.
Amo ir solitário pelos caminhos
Olhando a tarde parada no tempo
Parada no céu como um pássaro em vôo
E que vem de asas largas se abatendo.
Amo desvendar a vaga penumbra que desce
Amo sentir o ar sem movimento, a luz sem vida
Tudo interiorizado, tudo paralisado na oração calma...
 
Amo andar nessas tardes...
Sinto-me penetrando o sereno vazio de tudo
Como um raio de luz.
Cresço, projeto-me ao infinito, agitando
Para consolar as árvores angustiadas
E acalmar os pinheiros moribundos.
Desço aos vales como uma sombra de montanha
Buscando poesia nos rios parados.
Sou como o bom-pastor da natureza
Que recolhe a alma do seu rebanho
No agasalho da sua alma...
 
E amo voltar
Quando tudo não é mais que uma saudade
Do momento suspenso que foi...
Amo voltar quando a noite palpita
Nas primeiras estrelas claras...
Amo vir com a aragem que começa a descer das montanhas
Trazendo cheiros agrestes de selva...
E pelos caminhos já percorridos, voltando com a noite
Amo sonhar...
 
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O Amor tonifica o cabelo das mulheres
Torna-o vivo e dá-lhe um brilho natural.
Ondulações permanentes? só das do amor. Amai!
Nada melhor que o Amor para as moléstias do couro cabeludo.
 
O Amor ilumina os olhos das mulheres
Olhos sem cor? Amor! Olhos injetados?
Colírio lágrimas de Amor! Amai mulheres!
O Amor branqueia a córnea, acende a íris, dilata as pupilas cansadas.
 
O Amor limpa de rugas a fronte das mulheres
Para pés-de-galinha, beijos de Amor. Tende sempre em mente:
O Amor coroa as mulheres de pesados diademas invisíveis
Amai mulheres! A mulher que ama move-se dignamente.
 
O Amor heleniza o nariz das mulheres
Quando não dá-lhes delicados riques, particularmente nas asas.
Narizes gordurosos, com propensão a cravos, acnes ou espinhas?
Amai, mulheres! esfregando de leve os narizes de encontro ao nariz amado.
 
Amor horizontal é melhor e não faz mal. Bocas plenas rosadas palpitantes?
Beijos de Amor constantes! mantêm-nas bem lubrificadas.
Se quereis conservar aceso o ardor dos que vos amam
Beijai, mulheres! doce, triste, alegre, violentamente apaixonadas.
 
Nem Ardens, nem Rubinsteins: morte às pomadas!
Pomadas, cremes, só de amor, amadas!
Pele jovem e macia? amai se possível todo o dia
E ante o esplendor de vossas peles há de ruborizar-se a madrugada.
 
O Amor estimula extraordinariamente a higiene bucal
Os amorosos lavam-se os dentes, dão-se massagens nas gengivas, limpam-se as línguas com água e sal
Que é, como todos sabem, o composto químico da saliva
Que conseqüentemente se ativa impedindo a halitose e tornando a carícia palatal.
 
Basta de pastas: ó tu que transportas o leite contigo
Bom até a última gota! sou teu amigo ouve o que te digo;
Se amares o sangue funcionará melhor em tuas glândulas mamares
E terás seios autodidatas firmes objetivos singulares.
 
Chega de plásticas cirúrgicas, radioterapias e outras perfumarias
Vivei e amai ao sol: para aquele que vos ama vossos defeitos são poesia
Nada mais lindo que a feiúra da mulher amada.
Por isso eu sempre digo: qual regulador qual nada!
 
Regulador? besteira! Amai, mulheres. A verdadeira
Saúde da mulher está em ser boa companheira
Dê e tome, tome e mate, e mate de Amor. A mulher que se preza
Sabe sorrir. Conserve o seu sorriso. Valha o quanto pesa.
 
Se é de Amor, é bom. Eu sempre digo, e faço figa
Do que me diga não ser melhor que óleo de fígado.
Pois além de excitar o metabolismo basal
Para o simpático é o tônico ideal.
Eis o seu mal, não amar. Daí, decerto, a causa
Dessas palpitações, enxaquecas e náuseas...
O espetáculo começa quando a senhora chega. Espere um instante por favor
E repita comigo, bem devagar: A-M-O-R.
 
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Onde vais, elefantinho
Correndo pelo caminho
Assim tão desconsolado?
Andas perdido, bichinho
Espetaste o pé no espinho
Que sentes, pobre coitado?
 
- Estou com um medo danado
Encontrei um passarinho!
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Oh rosa que raivosa
Assim carmesim
uem te fez zelosa
O carme tão ruim?
 
Que anjo ou que pássaro
Roubou tua cor
Que ventos passaram
Sobre o teu pudor
 
Coisa milagrosa
De rosa de mate
De bom para mim
 
Rosa glamourosa?
Oh rosa que escarlate:
No mesmo jardim!
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O mundo parou
A estrela morreu
No fundo da treva
O infante nasceu.
 
Nasceu num estábulo
Pequeno e singelo
Com boi e charrua
Com foice e martelo.
 
Ao lado do infante
O homem e a mulher
Uma tal Maria
Um José qualquer.
 
A noite o fez negro
Fogo o avermelhou
A aurora nascente
Todo o amarelou.
 
O dia o fez branco
Branco como a luz
À falta de um nome
Chamou-se Jesus.
 
Jesus pequenino
Filho natural
Ergue-te, menino
É triste o Natal.
 
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Com um lindo salto
Lesto e seguro
O gato passa
Do chão ao muro
Logo mudando
De opinião
Passa de novo
Do muro ao chão
E pega corre
Bem de mansinho
Atrás de um pobre
De um passarinho
Súbito, pára
Como assombrado
Depois dispara
Pula de lado
E quando tudo
Se lhe fatiga
Toma o seu banho
Passando a língua
Pela barriga.
 
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Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
 Perdoai-os! porque eles não têm culpa de ter nascido...
 
Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo quanto existe.
 
Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
ssa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer exprimir o inexprimível
ssa irredutível recusa à poesia não vivida.
 
Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.
 
Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir passos na noite que se perdem sem história...
 
Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera em face da injustiça e do mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de si mesmo e de sua força inútil.
 
Resta esse sentimento de infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem para comprometer-se sem necessidade.
 
Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
E ao mesmo tempo essa vontade de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não tiveram ontem nem hoje.
 
Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante
 
E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.
 
Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem memória
Resta essa pobreza intrínseca, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do seu reino.
 
Resta esse diálogo cotidiano com a morte, essa curiosidade
Pelo momento a vir, quando, apressada
Ela virá me entreabrir a porta como uma velha amante
Mas recuará em véus ao ver-me junto à bem-amada...
 
Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
Esse eterno levantar-se depois de cada queda
Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
Essa terrível coragem diante do grande medo, e esse medo
Infantil de ter pequenas coragens.
 
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O mundo é tão esquisito:
Tem mosquito.
 
Por que, mosquito, por que
Eu... e você?
 
Você é o inseto
ais indiscreto
Da Criação
ocando fino
Seu violino
Na escuridão.
 
Tudo de mau
Você reúne
Mosquito pau
Que morde e zune.
 
Você gostaria
De passar o dia
Numa serraria –
Gostaria?
 
Pois você parece uma serraria!
 
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Ao ver uma rosa branca
O poeta disse: Que linda!
Cantarei sua beleza
Como ninguém nunca ainda!
 
Qual não é sua surpresa
Ao ver, à sua oração
A rosa branca ir ficando
Rubra de indignação.
 
É que a rosa, além de branca
(Diga-se isso a bem da rosa...)
Era da espécie mais franca
E da seiva mais raivosa.
 
- Que foi? - balbucia o poeta
E a rosa; - Calhorda que és!
Pára de olhar para cima!
Mira o que tens a teus pés!
 
E o poeta vê uma criança
Suja, esquálida, andrajosa
Comendo um torrão da terra
Que dera existência à rosa.
 
- São milhões! - a rosa berra
Milhões a morrer de fome
E tu, na tua vaidade
Querendo usar do meu nome!...
 
E num acesso de ira
Arranca as pétalas, lança-as
Fora, como a dar comida
A todas essas crianças.
 
O poeta baixa a cabeça.
- É aqui que a rosa respira...
Geme o vento. Morre a rosa.
E um passarinho que ouvira
 
Quietinho toda a disputa
Tira do galho uma reta
E ainda faz um cocozinho
Na cabeça do poeta.
 
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I - O FOGO
O sol, desrespeitoso do equinócio
Cobre o corpo da Amiga de desvelos
Amorena-lhe a tez, doura-lhe os pêlos
Enquanto ela, feliz, desfaz-se em ócio.
 
E ainda, ademais, deixa que a brisa roce
O seu rosto infantil e os seus cabelos
De modo que eu, por fim, vendo o negócio
Não me posso impedir de pôr-me em zelos.
 
E pego, encaro o Sol com ar de briga
Ao mesmo tempo que, num desafogo
Proibo-a formalmente que prossiga
 
 
Com aquele dúbio e perigoso jogo...
E para protegê-la, cubro a Amiga
Com a sombra espessa do meu corpo em fogo.
 
II - A TERRA
 
Um dia, estando nós em verdes prados
Eu e a Amada, a vagar, gozando a brisa
Ei-la que me detém nos meus agrados
E abaixa-se, e olha a terra, e a analisa
 
 
Com face cauta e olhos dissimulados
E, mais, me esquece; e, mais, se interioriza
Como se os beijos meus fossem mal dados
E a minha mão não fosse mais precisa.
 
Irritado, me afasto; mas a Amada
À minha zanga, meiga, me entretém
Com essa astúcia que o sexo lhe deu.
 
Mas eu que não sou bobo, digo nada...
Ah, é assim... (só penso) Muito bem:
Antes que a terra a coma, como eu.
 
III - O AR
 
Com mão contente a Amada abre a janela
Sequiosa de vento no seu rosto
E o vento, folgazão, entra disposto
A comprazer-se com a vontade dela.
 
Mas ao tocá-la e constatar que bela
E que macia, e o corpo que bem-posto
O vento, de repente, toma gosto
E por ali põe-se a brincar com ela.
 
Eu a princípio, não percebo nada...
Mas ao notar depois que a Amada tem
Um ar confuso e uma expressão corada
 
A cada vez que o velho vento vem
Eu o expulso dali, e levo a Amada:
- Também brinco de vento muito bem!
 
IV - A ÁGUA
A água banha a Amada com tão claros
Ruídos, morna de banhar a Amada
Que eu, todo ouvidos, ponho-me a sonhar
Os sons como se foram luz vibrada.
 
Mas são tais os cochichos e descaros
Que, por seu doce peso deslocada
Diz-lhe a água, que eu friamente encaro
Os fatos, e disponho-me à emboscada.
 
E aguardo a Amada. Quando sai, obrigo-a
A contar-me o que houve entre ela e a água:
- Ela que me confesse! Ela que diga!
 
E assim arrasto-a à câmara contígua
Confusa de pensar, na sua mágoa
Que não sei como a água é minha amiga.
 
***********************
 
 
 
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
ara chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos –
or isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
 
Assim será a nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos –
Por isso precisamos velar
alar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
 
 
Não há muito que dizer:
ma canção sobre um berço
m verso, talvez, de amor
ma prece por quem se vai –
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
 
Pois para isso fomos feitos:
ara a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte –
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos,  imensamente.
 
***************
 
 
Filhos... Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete...
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
ica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos? Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem xampu
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!
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Lá vai Candinho!
Pra onde ele vai?
Vai pra Brodóvski
Buscar seu pai.
 
Lá vai Candinho!
Pra onde ele foi?
Foi pra Brodóvski
Juntar seu boi.
 
Lá vai Candinho!
Com seu topete!
Vai pra Brodóvski
Pintar o sete.
 
Lá vai Candinho
Tirando rima
Vai manquitando
Ladeira acima.
 
Eh! Eh, Candinho!
Muita saudade
Para Zé Cláudio
Mário de Andrade.

Se vir Ovalle
Se vir Zé Lins
Fale, Candinho
Que eu sou feliz.
 
Ouviu, Candinho?
- Diabo de homem mais surdo..
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No teu branco seio eu choro.
Minhas lágrimas descem pelo teu ventre
E se embebedam do perfume do teu sexo.
Mulher, que máquina és, que só me tens desesperado
Confuso, criança para te conter!
Oh, não feches os teus braços sobre a minha tristeza não!
Ah, não abandones a tua boca à minha inocência, não!
Homem sou belo
Macho sou forte, poeta sou altíssimo
E só a pureza me ama e ela é em mim uma cidade e tem mil e uma portas.
Ai! Teus cabelos recendem à flor da murta
Melhor seria morrer ou ver-te morta
E nunca, nunca poder te tocar!
Mas, fauno, sinto o vento do mar roçar-me os braços
Anjo, sinto o calor do vento nas espumas
Passarinho, sinto o ninho nos teus pêlos...
Correi, correi, ó lágrimas saudosas
Afogai-me, tirai-me deste tempo
Levai-me para o campo das estrelas
Entregai-me depressa à lua cheia
Dai-me o poder vagaroso do soneto, dai-me a iluminação das odes, dai-me o cântico dos cânticos
Que eu não posso mais, ai!
Que esta mulher me devora!
Que eu quero fugir, quero a minha mãezinha quero o colo de Nossa Senhora!
 
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Senhor, logo que eu vi a natureza
As lágrimas secaram.
Os meus olhos pousados na contemplação
Viveram o milagre de luz que explodia no céu.
 
Eu caminhei, Senhor.
Com as mãos espalmadas eu caminhei para a massa de seiva
Eu, Senhor, pobre massa sem seiva
Eu caminhei.
Nem senti a derrota tremenda
Do que era mau em mim.
A luz cresceu, cresceu interiormente
E toda me envolveu.
 
A ti, Senhor, gritei que estava puro
E na natureza ouvi a tua voz.
Pássaros cantaram no céu
Eu olhei para o céu e cantei e cantei.
Senti a alegria da vida
Que vivia nas flores pequenas
Senti a beleza da vida
Que morava na luz e morava no céu
E cantei e cantei.
 
A minha voz subiu até ti, Senhor
E tu me deste a paz.
Eu te peço, Senhor
Guarda meu coração no teu coração
Que ele é puro e simples.
Guarda a minha alma na tua alma
Que ela é bela, Senhor.
Guarda o meu espírito no teu espírito
Porque ele é a minha luz
E porque só a ti ele exalta e ama.
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Desesperança das desesperanças...
Última e triste luz de uma alma em treva...
- A vida é um sonho vão que a vida leva
Cheio de dores tristemente mansas.
 
- É mais belo o fulgor do céu que neva
Que os esplendores fortes das bonanças
Mais humano é o desejo que nos ceva
Que as gargalhadas claras das crianças.
 
 
Eu sigo o meu caminho incompreendido
em crença e sem amor, como um perdido
Na certeza cruel que nada importa.
 
Às vezes vem cantando um passarinho
Mas passa. E eu vou seguindo o meu caminho
Na tristeza sem fim de uma alma morta.
 
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Quantos caminhos não fizemos juntos
Neruda, meu irmão, meu companheiro...
Mas este encontro súbito, entre muitos
Não foi ele o mais belo e verdadeiro?
 
Canto maior, canto menor - dois cantos
Fazem-se agora ouvir sob o Cruzeiro
E em seu recesso as cóleras e os prantos
o homem chileno e do homem brasileiro
 
E o seu amor - o amor que hoje encontramos...
Por isso, ao se tocarem nossos ramos
Celebro-te ainda além, Cantor Geral
 
Porque como eu, bicho pesado, voas
Mas mais alto e melhor do céu entoas
Teu furioso canto material!
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Será assim, amiga: um certo dia
Estando nós a contemplar o poente
Sentiremos no rosto, de repente
 beijo leve de uma aragem fria.
 
Tu me olharás silenciosamente
E eu te olharei também, com nostalgia
E partiremos, tontos de poesia
Para a porta de treva aberta em frente.
 
Ao transpor as fronteiras do Segredo
Eu, calmo, te direi: - Não tenhas medo
E tu, tranqüila, me dirás: - Sê forte.
 
E como dois antigos namorados
Noturnamente triste e enlaçados
Nós entraremos nos jardins da morte.
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Deus te fez numa fôrma pequenina
De uma argila bem doce e bem morena
Deu-te uns olhos minúsculos de china
Que parecem ter sempre um olhar de pena.
 
Banhou-te o corpo numa fonte fina
Entre os rubores de uma aurora amena
E por criar-te assim, leve e pequena
Soprou-te uma alma cálida e divina.
 
Tão formosa te fez, tão soberana
Que dar-te aos anjos por irmã queria
Mas ao plasmar-te a carne predileta
 
Deus, comovido, te criara humana
E para tua justa moradia
Atirou-te nos braços do poeta.
 
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Uma lua no céu apareceu
Cheia e branca; foi quando, emocionada
A mulher a meu lado estremeceu
E se entregou sem que eu dissesse nada.
 
Larguei-as pela jovem madrugada
Ambas cheias e brancas e sem véu
Perdida uma, a outra abandonada
Uma nua na terra, outra no céu.
 
Mas não partira delas; a mais louca
Apaixonou-me o pensamento; dei-o
Feliz - eu de amor pouco e vida pouca
 
Mas que tinha deixado em meu enleio
Um sorriso de carne em sua boca
Uma gota de leite no seu seio.
 
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Em casa há muita paz por um domingo assim.
A mulher dorme, os filhos brincam, a chuva cai...
Esqueço de quem sou para sentir-me pai
E ouço na sala, num silêncio ermo e sem fim,
 
Um relógio bater, e outro dentro de mim...
Olho o jardim úmido e agreste: isso distrai
Vê-lo, feroz, florir mesmo onde o sol não vai
A despeito do vento e da terra que é ruim.
 
Na verdade é o infinito essa casa pequena
Que me amortalha o sonho e abriga a desventura
E a mão de uma mulher fez simples, pura e amena.
 
Deus que és pai como eu e a estimas, porventura:
Quando for minha vez, dá-me que eu vá sem pena
Levando apenas esse pouco que não dura.
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Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.
 
É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.
 
Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.
 
O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...
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Um gato vivo é qualquer coisa linda
Nada existe com mais serenidade
Mesmo parado ele caminha ainda
As selvas sinuosas da saudade
 
De ter sido feroz. À sua vinda
Altas correntes de eletricidade
Rompem do ar as lâminas em cinza
Numa silenciosa tempestade.
 
Por isso ele está sempre a rir de cada
Um de nós, e a morrer perde o veludo
Fica torpe, ao avesso, opaco, torto
 
Acaba, é o antigato; porque nada
Nada parece mais com o fim de tudo
Que um gato morto.
 
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O pato

 

Vinicius de Moraes , Toquinho , Paulo Soledade
 
Lá vem o Pato
Pata aqui, pata acolá
Lá vem o Pato
Para ver o que é que há.
O Pato pateta
Pintou o caneco
Surrou a galinha
Bateu no marreco
Pulou do poleiro
No pé do cavalo
Levou um coice
Criou um galo
Comeu um pedaço
De jenipapo
Ficou engasgado
Com dor no papo
Caiu no poço
Quebrou a tigela
Tantas fez o moço
Que foi pra panela.
 
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Vinicius de Moraes , Paulo Soledade
 
Passa, tempo, tic-tac
Tic-tac,  passa, hora
Chega logo, tic-tac
Tic-tac, e vai-te embora
Passa, tempo
Bem depressa
Não atrasa
Não demora
Que já estou
Muito cansado
Já perdi
Toda a alegria
De fazer
Meu tic-tac
Dia e noite
Noite e dia
Tic-tac
Tic-tac
Tic-tac...
 
Vinicius de Moraes
http://www.viniciusdemoraes.com.br/site/
 
 

 

 

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